É de esquerda mas tem ipod

É recorrente que ouçamos acusações contra pessoas de esquerda que consomem algum artigo ou serviço mais caros: haveria contradição entre ser anti-capitalista e andar de táxi, ter ipod, gostar de Beatles, comer no Outback ou morar na Zona Sul. A primeira coisa que a gente pode sublinhar nessa opinião é o seu essencialismo: haveria nas coisas certas propriedades que lhes incutiriam uma, por assim dizer, identidade capitalista. A gente pode exercitar um desdobramento lógico desse pensamento. Se há coisas essencialmente “capitalistas”, “burguesas” ou de “direita”, deve haver também aquelas que são essencialmente de esquerda e que nos permitiriam devolver a contradição com uma lista que poderia ser gigante: É de direita mas tem férias, décimo terceiro e licença médica; é de direita mas vota; é de direita mas estuda em universidade pública, é de direita mas não trabalha desde os 7 anos de idade etc., etc.. Mas isso seria apenas reproduzir invertidamente a mesma forma tosca. O mais interessante é então perguntar: por que eu consideraria como “burguês” ou “capitalista” aquilo que é, material e concretamente, fruto do trabalho humano? Se a minha crítica de esquerda depõe contra a apropriação que uns poucos fazem sobre os recursos construídos por muitos, por que eu reproduziria e incorporaria no meu discurso essa mesma apropriação que a burguesia realiza na prática? Por que então a legitimidade de certos consumos deveria estar restrita à burguesia ou aos pró-capitalistas?

Membros do MST no McDonald’s. A foto foi instrumentalizada para indicar os limites da consciência política anti-capitalista (e também para ofender o MST, claro). Fonte: blog do Reinaldo Azevedo.

Parte da acusação do título me parece ter origem implicitamente na noção de superioridade moral e estética que a esquerda conferiria a aspectos da vida proletária. Nisso estariam incluídos desde samba até andar de ônibus e passar fome. Essa apologia da pobreza e das coisas dos pobres foi de fato em parte uma criação discursiva da própria esquerda, mantida por alguns até hoje, e que teve ao longo da história motivações as mais diversas, como uma valorização resistente diante de uma cultura dominante discriminatória ou o simples ressentimento de classe. Mas é um erro supor que isso seja típico ou basilar no pensamento de esquerda ou no pensamento anti-capitalista de forma geral. Se gastarmos uns 3 ou 4 segundos com as melhores referências da crítica ao capital veremos então que a questão é completamente outra: não a negação, como mau ou estranho, daquilo que foi engendrado pelo desenvolvimento econômico burguês; mas o combate a seu caráter exclusivo e excludente que, todavia, poderia ser revertido em uma distribuição igual, universal e potencializadora dos homens. Ou seja, a ideia de uma glamourização da pobreza faz mais parte de debates laterais, hoje muito inflamados pela falação de direita (Lobão, por exemplo), e não encontra nenhum lugar de relevo na tradição do pensamento teórico de crítica social ou na definição de ser de esquerda, ao contrário do que querem os twitteiros e polemistas de bar ocasionais.

Mas esse nosso interlocutor pode ter outro tipo de questão: como pode alguém ser solidário com os pobres e ele próprio estar em uma posição privilegiada? Denunciar a situação dos sem-teto quando ele próprio tem posses? Sobre isso, é essencial saber primeiramente que a crítica de esquerda (como a marxista, a que me filio) não é uma crítica moral sobre as pessoas, mas fundamentalmente uma crítica sistêmica, estrutural. O projeto do socialismo não seria então um grande Criança Esperança onde cada um se despojaria um pouco do seu egoísmo para que outros tivessem mais, mas uma mudança nas dinâmicas da sociedade que produzem a opressão e a desigualdade. E se há pessoas que gozam e se beneficiam com a ativa exploração e a carência alheias, trata-se de um conjunto de pessoas extremamente reduzido com posições bem especiais em empresas, governos, igrejas e outras entidades. Se há algo de denúncia moral no marxismo, ela não recai sobre o próprio trabalhador (ainda que ele tenha uma casa de praia) mas sobre aqueles que tem as rédeas dessa dinâmica social, ou seja, efetivo poder sobre a constituição da sociedade tal como ela é (cujas propriedades, elas sim, são politicamente relevantes). A “contradição” do Ipod, do laptop, do carro, etc., valeria para algum cristão (saca Jesus Cristo?) mas jamais para algum marxista porque nossa perspectiva não é a elevação moralista do indivíduo, mas as transformações coletivas do que nos determina como sociedade.

Com isso, não pretendo colocar que a questão do consumo é isenta de maiores significados políticos. Muito pelo contrário, me parece que não há mercadoria que não guarde histórias de roubos, de assassinatos, de tortura, de destruição ambiental. A cultura do consumismo em particular, em um momento de escala astronômica e irracional da produção de mercadorias, está no centro da hegemonia burguesa (e o que vale para o Ipod também vale para o Xing Ling da Uruguaina, todos construídos sob a mesma lógica). Tudo isso nos confronta eticamente e nos exige resposta não só como coletividade abstrata mas também como pessoas e indivíduos. Mas esse é um debate que não tem a ver com as tentativas estreitas de desqualificação da esquerda, em especial as ressentidas.

Foto de bastante repercussão tirada na ocupação da USP em novembro de 2011. Para o senso comum, o casaco da GAP e os óculos escuros indicariam a ilegitimidade da militância. (Foto de Werther Santana, da Agência Estado)

Sobre Wesley Carvalho

Professor e historiador.
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43 respostas para É de esquerda mas tem ipod

  1. Diego Rebouças disse:

    Tão bom quando um texto consegue ser ponderado e capaz de colocar a medida das coisas. Obrigado, Wesley.

  2. Rodrigo disse:

    Muito bom ler esse texto, isso é realmente algo muito ruim e prejudicial para a esquerda. Infelizmente a falta de uma clara diferenciação entre marxismo e franciscanismo também é bem forte dentro da esquerda, e isso acaba facilitando ainda mais que o senso comum caia na armadilha de avaliar uma contradição ideológica através da estética imediata. E a direita deita e rola.

  3. A questão é simples: ter acesso a certas benesses do capitalismo denota ter acesso ao Capital e ter acesso a este capital é um privilégio que cabe à uma determinada classe que não é a proletária. Basta dividir a sociedade em calsse de acordo com a renda (A,B,C,D…) para perceber que tem muito revolucionário trabalhador tendo mais acesso ao Capital que muito burguês. E que mesmo assim, nega terminantemente ser burguês. Não se trata de uma questão de moralidade, mas sim, de lógica matemática.

    • Wesley Carvalho disse:

      Erzulie, acredito que uma compreensão mais profícua do capitalismo não pense classe de acordo com renda, mas de acordo com certas posições estruturais de poder.Há dois textos neste blog que debatem diretamente essa questão e talvez te interessem: https://capitalismoemdesencanto.wordpress.com/2013/07/29/as-classes-sociais-ainda-importam-parte-1-de-2/

      As classes sociais ainda importam? (parte 2 de 2)

      O proletário não é aquele que consome menos, mas aquele que é destituído das propriedades dos meios de produção. Com essa definição, como você já bem reparou, é claro que um proletário pode ser rico e um burguês, pobre – e isso traz dificuldades teóricas e conceituais infernais. No entanto, se tomarmos o que estrutura o capitalismo a nível global, que é o que interessa para o argumento, a questão é menos complexa porque fica claro, dado o nível exorbitante de concentração, que há uma classe destacada de possuidores que dita os rumos do mundo: são eles que fazem o trabalho escravo asiático com alta tecnologia, são eles que decidem a política energética com danos ambientais irreparáveis, etc.. O trabalhador permanece alijado desse tipo de decisão que é constituidora do mundo, ainda que ele ganhe 100 mil reais por mês.

      O argumento do texto é que a discussão ética sobre os nossos consumos aconteça, mas que esteja fora de uma órbita de condenação moral sobre nós, trabalhadores, porque nossas propriedades não são aquelas que determinam as relações e as formas perversas da produção.

    • Valeska Silva disse:

      Nessa discussão, importa como você ganha seu dinheiro, e não como você gasta.

  4. Oscar disse:

    O marxismo não se baseia na luta de classes ? Não é esse o materialismo histórico ? Como pode então alguém lutar por uma classe que não é a sua ? Se o comunismo é o poder para o ploretariado não há sentido deste ser apoiado pela burguesia..

    • yagodorea disse:

      Exatamente por isso a questão do Projeto Popular se baseia numa revolução feita pelo Povo. Alguém pode lutar por uma classe que não é sua, apenas precisa existir solidariedade, empatia, e reconhecimento da luta de classes.

    • Raíssa disse:

      O ponto é: quem é proletariado?

    • Lucas Pratt disse:

      Então me responda pq Bakunin e Kropotkin que eram membros da nobreza ou até mesmo Engels que era um industrial puderam ter tanta importância no movimento internacional de trabalhadores?
      A sua “classe” não é uma determinação econômica e mecânica.
      Da mesma forma que simplesmente nascer pobre e filhos de trabalhadores te faz de esquerda, basta observar toda a massa evangélica defendendo as políticas conservadoras da bancada evangélica do congresso.

  5. Bianca disse:

    Concordo com isso, mas não justifica o consumo excessivo desses bens, o que acarretaria numa escassez de recursos naturais, sendo assim impossível alcançar o ideal de todos portarem igualmente esses produtos. Então ok ter o Iphone, mas nada ok ter os 5 tipos de Iphones que lançam a cada ano.

    • Wesley Carvalho disse:

      Bianca, concordo com você. O consumismo é algo diferente do consumo. No entanto, não podemos reduzir o problema ao nível da responsabilização individual.

  6. Alex disse:

    Bem, para quem estiver com preguiça de ler tanta demagogia aqui vai um resumo: Esquerdista caviar buscando desculpas para usarem produtos gerados pelo capitalismo opressor machista fascista.

    • Bernardo Lepore disse:

      Cara, lê de novo o texto. Parece que não entendeu.

    • AC disse:

      Gente semiletrada dá uma canseira…

    • Paulo disse:

      Concordo, Alex!
      Há 2 semanas atrás eu fui almoçar com um esquerdista caviar… O cara escolheu o restaurante, era tipo o mais caro lá das imediações, com música ao vivo, etc…
      Antes de pedirmos o prato do almoço, pedimos uma cerveja.. até aí tudo bem, mas ele pediu também uma porção das grandes, o que já achei estranho… e ok, fomos comendo… depois da porção, eu e ele já estavamos quase cheios. Então, cogitamos de pedir um prato do almoço ( o prato era muita comida ), e dividirmos a comida para nós dois, uma vez que não tínhamos fome mais.

      Só que o caviar não concordou em dividir e decidiu que era melhor pedirmos UM PRATO PARA CADA UM ahahahaha…. Cara, muito relutantemente eu aceitei, pois não tinha um prato individual menor. Beleza…. Chega lá os pratos.. eu como metade e não aguento mais… ele vai e come também METADE do prato dele ahahha, sobrou filet mignon, arroz, feijão… pqp…

      Ahhh.. e pra fechar com chave de ouro: enquanto estavamos comendo, um amigo dele liga no celular dele.. eles começam a conversar, e comentando sobre outro cara lá.. esse caviar ficava vomitando assim no telefone: “ahhh, não liga pra aquele cara não, ele é muito REAÇA, bla bla bla, bla bla bla”, enquanto isso comendo o filet mignon opressor dele ( ops, desculpe, ele não comeu o filet, deixou no prato! rsrrs)

      É foda isso de desperdiçar alimento. O cara ganha menos que eu, mas gasta muito mais. Mas pra que economizar, né? depois é só pedir ajuda pro papai estado! : – )

  7. Rodrigo Rocha disse:

    “é de direita mas vota”… Oi? Humm que tal estudar um pouco sobre o que esta falando, antes de falar a respeito. Direita e Esquerda não tem nenhuma relação necessária com democracia ou totalistarismo. Já tivemos governos de direita democráticos (EUA, Inglaterra…) e totalitários (Brasil da Ditadura, Itália Fascista), assim como j tivemos governos de esquerda democráticos (Venezuela, Bolivia…) e totalitários (Cuba, URSS…)´. Na verdade o totalitarismo tem muito mais relação com o extremismo ideológico do que com uma ideologia em particular. O Fascismo é a direita extrema, o comunismo a esquerda extrema, ou seja, anti-democrático é o extremismo não a ideologia. Só por esse erro absurdo ja fica claro que o seu texto não tem absolutamente nenhum conhecimento da questão, e apenas quis defender uma questão bem difícil de ser defendida, que é a da hipocrisia. Certamente alguém de direita que reclama de ter de pagar Fundo de Garantia mas pede ajuda para o governo quando sua empresa vai a falência é um hipcrita (ou reclama de pagar impostos ao mesmo tempo que pede melhoria dos serviços publicos). Assim como alguém de esquerda que defende direito dos trabalhadores e compra um ipod produzido por meio de trabalho similar ao escravo (ou protesta contra child soldiers na África, mas compra maconha daquele traficante que coloca armas nas mãos de crianças e adolescentes para serem soldados do tráfico). Ambos são hipócritas, e adivinhe só? Dois errados não fazem um certo.

    • Wesley Carvalho disse:

      O direito ao voto, no formato liberal que conhecemos hoje, foi fruto da mobilização de esquerda dos subalternos (o que não significa marxistas, claro esteja). Essa noção de democracia foi incorporada pelo discurso da direita (e por isso seu estranhamento) mas apenas depois de consolidada e institucionalizada. Veja-se por exemplo o movimento cartista na Inglaterra ou o contexto brasileiro nas décadas de 20 e 30.

  8. Se para ser de esquerda é preciso ser pobre de nascença, então é preciso modificar a história da esquerda internacional. Os socialistas utópicos como o Barão Saint-Simon ou como o industrial Owen seria descartados da história do socialismo. Engels era administrador das indústrias do pai. Marx, que era de origem pequeno-burguesa, era, no entanto, casado com a baronesa Von Westfallen, irmã de um dos principais ministros do ultra-conservador Bismarck. Poderíamos citar milhares de exemplos mais de elementos desgarrados da burguesia que assumiram como sua a causa dos trabalhadores. Por este tipo de raciocínio, o socialismo nunca existiu.

  9. Danilo disse:

    “haveria nas coisas certas propriedades que lhes incutiriam uma, por assim dizer, identidade capitalista”
    Não. As coisas não possuem propriedades essenciais, objetivas (Marx afirma que sim, né? O tal valor da força de trabalho empregada). O que se coloca em questão é o sentido subjetivo do ato, da práxis. O problema não é consumir produtos supostamente capitalistas, mas agir no mercado como um capitalista e, por conseguinte, fomentá-lo.

    “é de direita mas tem férias, décimo terceiro e licença médica, (…) estuda em universidade pública”.
    Para quem defende um estado mínimo, nos moldes do libertarianismo, tais “práticas” são sim incoerentes. Não há nada de “tosco” em apontar tais incoerências.

    “(…) noção de superioridade moral e estética que a esquerda conferiria a aspectos da vida proletária”.
    Não é questão moral ou estética. Se o argumento procede, a exploração da mão-de-obra para a formação do mais valor é também mero moralismo.

    “a crítica de esquerda (como a marxista, a que me filio) não é uma crítica moral sobre as pessoas, mas fundamentalmente uma crítica sistêmica, estrutural. O projeto do socialismo não seria então um grande Criança Esperança onde cada um se despojaria um pouco do seu egoísmo para que outros tivessem mais, mas uma mudança nas dinâmicas da sociedade que produzem a opressão e a desigualdade”.
    Resumindo: pode consumir produtos produzidos inclusive por escravos asiáticos (Apple, por exemplo) e manter o egoísmo diante de flagelos sem culpa. Nosso negócio é bolar uma revolução do alto das nossas intelectualidades para, a partir do plano das ideias, prescrever um modo de vida completamente diferente daquele que fomentamos.

    “nossa perspectiva não é a elevação moralista do indivíduo, mas as transformações coletivas do que nos determina como sociedade”.
    Vamos transformar o mundo escrevendo um livro em nossos Macbooks?

    “não pretendo colocar que a questão do consumo é isenta de maiores significados políticos. Muito pelo contrário, me parece que não há mercadoria que não guarde histórias de roubos, de assassinatos, de tortura, de destruição ambiental. A cultura do consumismo em particular, em um momento de escala astronômica e irracional da produção de mercadorias, está no centro da hegemonia burguesa (e o que vale para o Ipod também vale para o Xing Ling da Uruguaina, todos construídos sob a mesma lógica)”
    Mudou de ideia?

    “Tudo isso nos confronta eticamente e nos exige resposta não só como coletividade abstrata mas também como pessoas e indivíduos”.
    Mudou de ideia outra vez? Como você disse, isso não é problema “para algum marxista porque nossa perspectiva não é a elevação moralista do indivíduo”.

    “Mas esse é um debate que não tem a ver com as tentativas estreitas de desqualificação da esquerda”.
    Tá. É um debate a ser feito de portas fechadas pelos diretores do partido.

    • “Não. As coisas não possuem propriedades essenciais, objetivas (Marx afirma que sim, né? O tal valor da força de trabalho empregada). O que se coloca em questão é o sentido subjetivo do ato, da práxis. O problema não é consumir produtos supostamente capitalistas, mas agir no mercado como um capitalista e, por conseguinte, fomentá-lo.”

      Não se pode confundir objetividade e essencialidade. Na teoria do valor de Marx, o valor equivale ou exprime a quantidade de trabalho despendida num objeto ou serviço. Essa expressão é objetiva, mas de forma alguma essencial. A forma da objetividade do valor é exclusivamente social, depende inteiramente do objeto funcionar como mercadoria, e a quantidade de trabalho que o valor exprime não é medida diretamente para cada trabalho individual em cada objeto individual, mas se mede no mercado, segundo médias socialmente necessárias.

      A respeito de agir como um capitalista no mercado, isso só acontece quando se compra fatores de produção a serem executados por mão de obra alheia.

  10. Maria Alexandra disse:

    Internet, personal computer, facebook, não são meramente frutos do trabalho humano. São frutos da criatividade e da livre iniciativa, do individualismo (que absolutamente nada tem a ver com egoísmo), a certeza de que o fruto de seu trabalho será seu e não de burocratas. São frutos da liberdade de expressão (alguém imagina facebook ou mesmo a internet sem liberdade de expressão?), de baixa carga tributária, sào frutos dos Estados Unidos da América, a mesma nação que inventou as eleições livres, o princípio do one man one vote, a democracia em 1776. Quanto fanatismo, por que nada disso surgiu na URSS? Por que em Cuba é necessário autorização especial para usar a internet? E mesmo assim não se tem livre acesso a qualquer site que se queira? Comunismo não distribui riqueza, comunismo distribui pobreza, já tivemos várias provas históricas. Férias, o fictício 13o (x/13 x 13 = x/12 x 12) a proibicão do trabalho infantil tudo isso existe e foi criado em países liberais, não há nenhuma contradição.

  11. Bruno Cunha disse:

    Havia muito tempo que eu procurava um texto relevante sobre esse assunto. É algo que não é discutido como deveria ser, parabéns pela incrível correlação lógica construída!

  12. Parabéns Wesley por um texto tão acessível num assunto que causa, ainda tantas dúvidas. Contribuição sensata e ponderada para o debate que só tende a aumentar com a proximidade de novas eleições no Brasil.

    Outrossim, continua assustador para não dizer pavoroso, o grau de hidrofobia anônima dos comentários das pessoas em blogs e redes sociais. A sensação que fica é quem há um misto de ódio, revanchismo e predisposição ao confronto ideológico, não no campo das ideias, mas no real aniquilamento de tudo aquilo que incomoda o “status quo”. e que pareça contrário a um senso-comum reacionário.

    Sabemos que nos grupos de esquerda, vez por outra, encontramos comportamentos semelhantes mas ele é uma exceção e um recorte de grupos radicais. Mas do lado dessa juventude ( e deduzo que o seja) conservadora esse é o default de atitude nas discussões.

    Não é à toa o fascismo violento que verificamos nas manifestações de Junho passado onde esse tipo de hostilidade foi transposta para a vida real e incentivada. Desenha-se um perfil de pessoas voluntariosas, impacientes e, por vezes, mimadas. Fruto de uma educação baseada não na ampliação de uma visão crítica e humanitária mas numa exaltação da meritocracia e do individualismo carreirista.

    O estrago de 20 anos de Ditadura é mais duradouro do que imaginávamos.
    Aqui estão os filhos dos filhos da TFP.

    Sigamos libertários, progressistas mas atentos.

  13. bruno disse:

    Acho que dá para relacionar a questão individual com a estrutural em certos aspectos.

    Pessoalmente, a partir do momento em que comecei a estudar a relação do valor com o valor de uso, comecei a negar todo e qualquer tipo de produto ligado diretamente a ostentação: marcas e etc. Basicamente o “se achar por ter”.
    OBS: digo diretamente, pois a ostentação está estruturada nos preços, ou seja, não é como se tivéssemos muitas opções em nossa sociedade.
    Mas por exemplo, não vejo em produtos tecnológicos (que tem preços altos pela inovação) uma ligação direta com a ostentação. Volto a repetir que, claro, no capitalismo é impossível separar a ostentação de qualquer objeto, por ele estar ligado diretamente a estrutura de formação de preço e necessidade da mais-valia.
    1) A Apple é uma empresa de ponta tecnologicamente que também está fundada em ostentar a marca, por exemplo.
    2) O custo de produção de uma camisa hoje em dia é de centavos, por que pagamos R$ 50,00 ou mais? O alto preço é um problema de imposição estrutural, a redução do custo e manutenção dos preços de venda é uma das principais formas de manutenção da mais-valia (manutenção da taxa de crescimento dos lucros).
    Agora, entender o pouco que entendo do funcionamento de nossa sociedade me fez de fato negar muitas coisas que antes talvez fosse normal. Isso foi com muita luta, pois como todos, sou reflexo dos valores de nossa sociedade. Hoje, por exemplo, aprendi a não gostar de refrigerante, raramente como em fast foods, consumo muito menos bens materiais que antes, compro roupas que não demonstram relação com marca, valorizo experiência (viagens, sair com amigos) à consumo, etc…

    Resumindo, por mais que inseridos em uma estrutura que não nos permita não ostentar, já que o preço é uma imposição estrutural, existem liberdades individuais que podemos fazer. Existem mudanças que podemos tomar ao questionar o porquê de tudo ser como é. Por que gosto de fast food? Posso comprar uma camisa que não demonstre marca? E dentro dessas pequenas liberdades individuais, fazer o máximo do “ético” possível.

    Interpretar a ostentação pela interpretação marxista é enxergar um problema estrutural que, além disso, é violento. A sociedade, inserida na interpretação burguesa, que nem percebe que toda sua interpretação esta fundada no valor ligado a utilidade do objeto (O neoliberalismo como descrito por Foucault), nunca enxergará a violência que é comprar uma camisa de R$ 400,00. Nunca enxergará na ostentação uma violência. A violência da ostentação apenas existe na interpretação Marxista, onde o valor econômico se liga a utilidade e ao trabalho, de maneira dialética.

    Portanto sim, em certos aspectos, vejo contradição em alguém usar uma camisa da GAP e lutar contra o Capital, mas NUNCA desvalorizaria o objetivo desse rapaz por ele não enxergar aí uma contradição, pois isso é pressupor que todos interpretam o mundo como eu. E assim, apenas agiria com a mesma violência que a direita, tipificada principalmente na mídia brasileira: criticar e desvalorizar com seu próprio viés interpretativo sem nunca tentar entender a interpretação do outro.
    Uma das violências reproduzidas por nossa mídia é considerar a sua interpretação como uma verdade absoluta, pois conseqüentemente, taxa o que pensa e age diferente de louco.
    E agora, o que fará o louco que não pensa igual?
    O louco deve se padronizar para deixar de ser louco, apenas assim será socialmente aceito, não é?
    Impedir uma pessoa que não aceita a simetria dos valores e da cultura de nossa sociedade é retirar sua liberdade de critica e de diferença, é, portanto, uma violência.

  14. Thiago disse:

    Ótimo texto, parabéns.

  15. Mauricio disse:

    “haveria nas coisas certas propriedades que lhes incutiriam uma, por assim dizer, identidade capitalista”

    O grande problema do socialismo/comunismo é a ausência de geração de riquezas capaz de permitir que sua população tenha renda suficiente para adquirir objetos criados pela lógica capitalista.

    A remuneração do trabalhador comunista é o suficiente apenas para sua subsistência. Basta observarmos cuba para percebermos que o comunismo como conhecemos até agora é um completo fracasso econômico, político e social.

    • Juliana Lessa disse:

      Maurício, alguns pontos:

      1 – Os seres humanos geram riquezas independentemente do modo como elas são produzidas. Geramos riquezas nos tempos das cavernas, na antiguidade, na idade média e por aí vai. Isso significa que o capitalismo não é o responsável pela geração de riquezas. O que diferencia a forma pela qual o capitalismo produz riquezas da forma pela qual as riquezas eram produzidas na idade média, por exemplo, é a propriedade dos meios de produção e a forma como essas riquezas são apropriadas. Portanto, afirmar que o socialismo não produz riquezas me parece estranho, já que este representa um modo alternativo de produzir riquezas. E citar o exemplo de Cuba sem mencionar o bloqueio econômico imposto à ilha é desconsiderar uma série de fatores históricos.

      2 – Quanto à remuneração dos trabalhadores, acho que sua análise deve considerar não só o “valor numérico” dos salários, mas também a qualidade e a amplitude dos serviços públicos oferecidos à população. Se eu recebo um vale alimentação do governo, se eu não precisar pagar aluguel, escola e plano de saúde porque os serviços públicos funcionam, acho que o “valor numérico” do salário tem que ser relativizado.

  16. Renan disse:

    Nossa cara, tudo bem você contra-argumentar o que dizem sobre a esquerda consumir produtos do capitalismo, mas você demonstrou total ignorância sobre a direita política e sobre os cristãos. Se falar aquela frase “é de direita, mas…”, com o que você enumerou no texto, as pessoas vão rir muito da sua cara.

    Mudando de assunto, a minha vida (e não Marx ou outros “pensadores” que apenas imaginam um mundo que não existe) me ensinou que, na maioria dos casos, não existe opressor. Existe apenas o oprimido! E como tem gente que luta (literalmente) por aquilo que simplesmente acha que tem “direito”, palavra usada como sinônimo de obrigação dos outros para com você. Por essas e outras evidências que discordo do marxismo, comunismo e outros ismos relacionados.

    • Wesley Carvalho disse:

      Renan, aquelas coisas que enumerei foram conquistadas pela movimentação da esquerda (o que não significa marxistas, claro esteja). Elas foram incorporadas pelo discurso da direita (e por isso seu estranhamento) mas apenas depois de consolidadas e institucionalizadas. Veja-se por exemplo o movimento cartista na Inglaterra ou o contexto brasileiro das décadas de 20 e 30.
      Em relação ao cristianismo, é muito claro que suas primeiras mensagens, as dos evangelhos, entendem a pobreza como uma virtude a ser buscada e como essencial para a espiritualidade elevada. Mas é claro que os cristãos há séculos estão fazendo outra coisa.

  17. Clarice disse:

    Não entendi o que Jesus Cristo tem a ver com o assunto… pode me explicar?

    • Wesley Carvalho disse:

      Clarice, há duas coisas. A primeira é que a mensagem dos evangelhos faz apologia da pobreza, inclusive a colocando no centro do projeto messiânico. Ou seja, a pobreza aparece ali como uma virtude (você é melhor religiosamente se for pobre) e, por vezes, como uma obrigação religiosa radical (você tem que ser pobre para ser cristão). A segunda coisa é que o cristianismo dos evangelhos coloca sobre o fiel uma responsabilidade moral perante a pobreza do próximo (repartir o pão em uma situação de carência, por exemplo).
      O que eu coloco no texto é que nada disso é fulcral no pensamento da esquerda marxiana porque ele não é nem baseado no indivíduo nem baseado na moral.

      • Clarice disse:

        Entendi Wesley. Desculpa por não ter elogiado seu texto antes de deixar meu comentário, isso foi rude. Gostei muito do texto. Apenas acho que o Cristianismo não pode representar o homem que foi Jesus Cristo. Acredito nesse homem e não tenho religião, alem disso um homem que pregava a paz e amor não poderia ter sido pior representado do que por pessoas que mataram e matam em seu nome. No texto acho que você poderia ter citado o cristianismo, ao invés de Jesus Cristo.
        Um abraço!!

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  21. Hugo disse:

    E o Fetichismo da mercadoria que Marx pregava ? quer dizer que ele tava errado ?

    • Wesley Carvalho disse:

      Hugo, talvez haja uma má compreensão do que Marx analisou (e não “pregou”). O fetichismo da mercadoria não significa fetiche pela mercadoria, isto é, algo como uma vontade grande de ter mercadorias. O fetichismo da mercadoria é outra coisa, que não tem a ver com o assunto do texto.

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